outubro 22, 2022

Preconceito - Origens, Raízes e Polarizações






Antecipadamente, peço desculpas ao leitor.
Este é um texto de conteúdo intenso porque questiona hábitos sociais, entretanto são justamente eles que oferecem boas oportunidades de reavaliação e um bom teste de autoanálise e de percepção coletiva.
A imagem de um copo foi elegida por sua simbologia forte pois remete à última ceia de Cristo e à mística do Santo Graal, sendo contudo, parte do contexto cotidiano 
que também simboliza posturas sociais independentes de crenças religiosas ao longo de gerações desde tempos remotos.



Por que tanto preconceito?

O preconceito tem sua origem na necessidade de autodefesa através da vaidade pela busca da superação constante dos nossos complexos de inferioridade.

Sentir-se superior é fonte de autoconfiança e conforto emocional, mas depende da existência de algo relativamente inferior.


Por que tanto complexo de inferioridade?

Todos nós temos limitações, embora diferentes, que deixam claro a mensagem de que somos muito restritos e vulneráveis.

Temos intensa dificuldade de lidar com estes dois sentimentos porque ameaçam o nosso instinto de sobrevivência física e emocional. 

Então, para equilibrar esses sentimentos que as restrições instigam, criamos padrões e ações que busquem contrapor tudo isso.

Sentimos que beber em um copo especial faz de nós alguém também especial, superior em alguma forma.

Então criamos padrões de superioridade.

Inventamos diversos copos, um para cada finalidade.

As regras sociais vão sendo rebuscadas com sofisticações desnecessárias a pretexto de refinamento social. Aqueles que atendem a elas fazem parte de uma elite. Por conseguinte, aqueles que estão fora desse "clube" então em desvantagem, taxados em posição inferior.

Criamos termos tal como "bárbaros" ou designamos uma pessoa como "simples" para apontar a falta desse "refinamento social" pertinente a uma cultura, bem como uma multidão de outros eufemismos para sustentar o disfarce elegante de uma natureza emocional insegura.


O preconceito nasce assim.
E ele é alimentado toda vez que criamos e mantemos pretensas regras ou justificativas para categorizar a qualidade superior de algo ou de alguém em detrimento dos demais, quando as diferenças de fato não determinam um incentivo a uma verdadeira natureza espiritual efetivamente agregadora. Pelo contrário, são regras de consequências deletérias, desagregadoras pois infligem o látego da humilhação e instigam a revanche, estimulando ações ora pelo desejo de pertencer ao "clube social", ora pelo desejo de destruí-lo quando a rejeição dói no ego, ou mesmo pela frustração quando inacessível.

A história está repleta de casos assim, pois a maioria de seus grandes eventos nascem do fruto dessa desagregação. 

O preconceito é um padrão incentivado em cada escolha que fazemos, mas não é uma condição "sine qua non", e portanto, devemos ficar atentos para dirimir o quanto de nossa decisão foi proveniente deste mal.

A escolha de nossas roupas no sentido de agregar valor a nós mesmos e de nos qualificarmos em faixas próprias da sociedade é tão discriminador quanto as sociedades que classificam seus cidadãos em castas.
Enfim, são conceitos que partilham o mesmo sentido de criar estratificações sociais.

E fazemos tudo isso sem pensar, sem sentir, como se fosse algo tão natural como atender às nossas necessidades físicas. Tais como elas, as necessidades psicológicas impõem necessidades tão prementes quanto.

O comportamento impensado é vivido de forma natural, normal ou mesmo como uma grande obrigação social trivial do cotidiano, sem levar em consideração que nesses pequenos gestos vamos alimentando a torrente do preconceito de múltiplas formas, porque embora diversos têm a mesma origem emocional.

Raramente pensamos nisso porque, afinal de contas, a cultura social é um pacote fechado que você ganha de presente mas que representa uma obrigação, antes mesmo que você seja capaz de avaliá-lo. A mente infantil é condicionada pelo hábito comportamental sem muita capacidade de análise ou objeção, contudo, compete à mente quando adulta reavaliar cada um dos itens dessa herança cultural.



Na busca de uma diretriz, quando eu penso em Jesus, o modelo comportamental dos que se dizem cristãos no sentido de seguidores de Cristo, observa-se que Ele viveu um exemplo oposto — simplicidade e amor sem discriminação.

Então, diante da contradição de nossas idílicas crenças culturais, precisamos buscar o "perdão" das nossas contravenções à nossa própria crença, quando então, convenientemente, inventamos meios de expurgar a culpa através de pequenas ou grandes "penitências" oferecidas pelos cultos religiosos como subterfúgio ao peso da consciência, todavia sem trabalhar a mudança do hábito.

Não funciona, apenas alivia provisoriamente.

É como soprar um machucado. Alivia a dor, mas aumenta a infecção.

A "majestade" de Cristo não veio de atos externos emprestados à força de convenções, mas do comportamento moral e da capacidade intelectual que banhavam de luz a todos que se aproximavam, sem que Ele precisasse fazer alarde de suas próprias capacidades.

Jesus era antes de tudo um agregador pelo amor e repudiou cada hábito que nos incentivasse no caminho oposto, fosse ele consagrado pela cultura de seu povo ou não. Deixou sua mensagem clara, repetidamente, ou melhor, exaustivamente.



Temos que viver em sociedade. É verdade.


Podemos e precisamos acompanhar alguns padrões básicos necessários para que possamos conviver socialmente. Importante seria fazer isso sem alimentar o sentimento de superioridade e de vaidade. Principalmente a última que vive sob o disfarce da dignidade.


Negar-se a tomar um copo de vinho usando um copo de água pode ser uma ação de escolha sutil.

Se o momento é definido pelo rigor da etiqueta social, nada mais natural que atendê-la para não ferir sentimentos desnecessariamente. Se o seu sentimento não comunga os propósitos que atendem à futilidade da vaidade e do sentimento de superioridade, torna-se uma ato de carinho e tolerância com aqueles que ainda não entendem seu ponto de vista.

Se o momento não requer tal rigor, ou tanto rigor, pode ser uma oportunidade para o exercício da simplicidade e da lembrança que devemos manter viva em nossas mentes — a rejeição às regras que alimentam esse rio caudaloso da descriminação e do preconceito.

É preciso sorrir das nossas próprias frivolidades, porque afinal de contas... um copo é um copo, cuja utilidade básica é conter líquidos, mesmo que pensem aqueles que procurem justificar as suas diferenças como atributos de qualidades especiais à cada tipo de bebida!

Se o odor de uma bebida é afetado de alguma forma, talvez pela proximidade do seu manejo ao segurá-la, então uma sanitização poderia resolver, substituindo a longa haste.


No singelo ato de segurar um copo, você pode definir a natureza e a forma de participar da sociedade, se engrossando as fileiras da discriminação e do preconceito ou buscando agregar valor à união social.


O preconceito é o berço das divisões que finalmente culminam em conflitos que escalam até as polarizações radicais, eventualmente terminando em guerras.


Então você reclama da miséria que a guerra traz no bojo da destruição de toda ordem, inclusive daquela dignidade que você tanto protegia e alimentava quando segurava orgulhosamente o seu copo de vinho, fazendo da haste e dos dedinhos arranjados o seu símbolo de status. Nestes momentos, sob o manto da miséria que a guerra traz à maioria, a dor e a desesperança descobrem a frivolidade das ações que pareciam ingênuas, mas que reforçavam ações maiores no mesmo sentido, tornando-se os tijolinhos da construção dessa destruição.

O sofrimento nos desperta para a realidade dos nossos erros.


Pequenas ações e grandes efeitos — efeito borboleta.


NOTA: 

Se você, ao ler o texto, ficou desconfortável por sentir-se de alguma forma identificado, console-se comigo, porque este texto nasceu das minhas próprias ponderações pela autocrítica.

:-) 

:-| 

:-(



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