Talvez imaginem que não passo de um tolo, por conta de não mais acreditar que possamos controlar nossas vidas. Podemos e necessitamos interagir com ela, ampliando ou amenizando eventos positivos ou negativos que compõem o nosso destino.
Quando jovem, porém, eu carregava a convicção de que somos nós que fazemos nossa vida, e que traçamos nossos destinos.
O passado, no entanto, escarneceu dos meus esforços
diligentes, bem estudados e cujo planejamento sempre pareceu tão bom que contou
com o apoio do senso comum.
Esse mesmo passado tinhoso, marrento que fazia questão de
demonstrar seu poder medindo forças com a minha razão em prol de intuições
descabidas, que acabavam por se confirmar em realidades inesperadas, tombando por terra
meus melhores planejamentos, ensinando-me constantemente que a autoconfiança
esbarra com a prepotência.
Tanto fez ao longo dos anos, que me convenceu da impotência
diante do desconhecido, onde por mais racionais, organizados e planejados que
se possa ser, ainda assim não podemos adivinhar as interações provocadas por
eventos imprevisíveis do macro cosmos a que pertencemos, prognosticáveis apenas por uma força maior que determina
a linha mestra do processo que conduz nossos destinos, deixando-nos apenas as
tarefas menores de interagir com ele através das opções que temos.
Tal como uma linha férrea que determina o curso, deixa-nos
apenas a escolha de percorrê-la de forma mais rápida ou não com algumas
variações pessoais que determinam a qualidade com que empreendemos tal viagem
da alma.
Quando imaginamos ter a liberdade por possuirmos o poder de definir
nossas vidas, pode ter certeza que a vida comunga por um tempo com os nossos
sonhos, nada mais.
Acordamos de nossas fantasias tomados pela dor da desilusão,
extenuados pela impotência, onde o destino retoma para si o curso de nossas ações,
levando de roldão nossos sonhos, esperanças e crenças que desvanecem tal como
fantasias pueris.
A arrogância da juventude cede à superação pela aceitação na
idade madura, aprendizado que só o peso dos anos constrói em nosso caráter cravado
pelas cicatrizes da luta que empreendemos em defesa daquilo que imaginávamos acreditar.
Existe uma verdade muito maior que aquela que
pensamos perceber, uma vez que a vida é expressão incomparavelmente maior que a
nossa própria.
A vida, contudo, tem seus deliciosos caprichos e materializa-se
para alguns como personagem cúmplice de um destino ditoso, parceira nas
realizações profícuas de uma vida de sucesso, ora disfarçado como dádiva
divina, ora como dívida que se vai acumulando ao longo do tempo, consumindo o
nosso futuro em pesado resgate dos erros que acumulamos em troca desse aparente
sucesso.
Raras vezes, o sucesso brota como flor autêntica do avanço da
alma na direção do espírito, sem constrangimentos que as restrições da matéria
provocam, ou sem o peso dos prejuízos morais utilizados como moedas de troca na
barganha pelo conforto.
Como flor de rara beleza surgindo em meio à multitude de
outras expressões da vida, não clama pra si a beleza que carrega, nem mesmo
abraça o desejo de reconhecimento da perfeição que transcende tudo o mais.
Segue o seu ciclo, e morre tão discretamente como
nasceu e viveu.
Hoje ciente que a vida toma para si as ações quando julga necessário, finco-me na luta diária apenas pela razão de manter sã a consciência que sustenta o equilíbrio do espírito e resguarda a sanidade quando não podemos evitar a dor.
A dor quando impingida à alma despreparada, desguarnecida
pelo arrependimento que rouba nossas defesas e nos faz sucumbir perante o
próprio julgamento, conduz na maioria das vezes à prostração da alma, que jaz
inerte, magnetizada na dor auto imposta, quando não se perde nos labirintos da
loucura sem mais encontrar saída para a razão por si mesma.
E assim trafega a alma, nessa viagem patrocinada pela vida,
que muitas vezes assume o papel da morte para transformar o que somos hoje,
fazendo-nos renascer amanhã em outra expressão desconhecida da pregressa.
E por conta do novo que não pode ser conhecido do velho,
para que não desapareça antes mesmo de nascer, trafegamos de um ponto a outro,
sem sabermos de onde viemos e para onde vamos.
Em meio à nossa ignorância, ainda imaginamos ter o poder de
controlar esse processo, quando no máximo temos as migalhas das opções, que
assim mesmo nos obriga às decisões mais cegas que conscientes, apostando mais
que supostamente escolhendo, porém sempre colhendo os seus frutos.
Meros viajantes de origem desconhecida, sem destino próprio
que não aquele conduzido pelo processo que o transporta.
Viajantes do tempo-espaço que ignoramos, não sabendo ao
certo se nos deslocamos porque fluímos ou se fluímos porque nos deslocamos, no
entanto sentimos a dor da transformação sem compreendermos sua natureza.
NOTA:
Ontem fui ao cinema e assisti ao filme "A Viagem", com Tom Hanks.
Veio bem a calhar.
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