Todos nós seguimos na inércia cultural que herdamos do
ambiente em que nascemos ou vivemos.
O mundo ama futebol.
O esporte é a oportunidade para se pegar um lado e torcer por
ele.
É algo nativo da nossa natureza.
Parece mesmo uma necessidade psicológica torcer por algo!
A vida real, no entanto, não é sempre como no esporte.
Muitas vezes não tem lado certo, muitas vezes não tem um lado vencedor, mesmo que alguém
vença.
Israelenses não estão isentos de erros.
Tão pouco os palestinos.
A contabilidade do balanço da vingança e da punição redunda em um número infinito
e sem perspectiva de solução, para ambos os lados.
O Hamas conseguiu o que queria.
Aproveitando-se do sangue quente dos radicais, sejam eles de esquerda ou de direita, quebrou a magia de segurança que o “domo israelense” proporcionava a Israel com o objetivo único de desestabilizar psicologicamente o inimigo e provocar uma
reação igualmente única, exacerbada, algo típico e sob encomenda para radicais.
Israel mordeu a isca.
O Hamas sabendo que o escudo(domo) era a sensação de segurança que mantinha o
frágil equilíbrio, depois de quebrá-lo, ainda arrastou duas centenas de reféns
como arremate de seu ardiloso plano, nada comparado em número às vítimas que
Israel já fez desde que começou a ofensiva de retaliação.
O Hamas sabia que assim chamaria Israel para uma reação inédita onde o orgulho
ferido, a insegurança e o desespero do inimigo não avaliariam o preço adequado à sua reação com o
equilíbrio necessário, pois radicais não têm tal equilíbrio, por isso são radicais!
E o Hamas sabia disso.
O Hamas apenas esperava o alvo ideal para a sua estratégia: aguardavam um radical tão exacerbado quanto eles próprios.
Israel mordeu a isca sinistra da estratégia do oponente que busca desprestigiar o
inimigo a qualquer custo, mesmo que seja ao custo de seu próprio povo, porque o
que é uma guerra senão o sangue derramado de seus compatriotas? Não é essa a
visão que temos de patriotismo? Seja espontâneo, ou compulsório como no caso
dos palestinos?
Se o Hamas cair, ao menos por algum tempo, certamente
Netanyahu poderá não sobreviver politicamente à empreitada por muito tempo,
levando os israelenses onde os palestinos queriam: do papel de vítimas da WW2
para os mais novos algozes de um novo panorama mundial que se desenha no horizonte
político entre a competição de dois blocos econômicos e que pode culminar na WW3.
Mesmo que Israel reduza a cinzas a faixa de Gaza, ainda
assim não se garante que o Hamas não renascerá do ódio, do ressentimento pelo
sofrimento imposto aos palestinos, não só àqueles de Gaza, mas em todos os
corações que assistem o conflito.
Acho mesmo que o Hamas estava inspirado pelo espírito de
Goebbels.
Perdoem-me a ousadia da comparação, mas não vejo propaganda tão engendrada assim desde a segunda guerra mundial. Se estou enganado, peço antecipadamente desculpas, mas é o que sinto, e que grande parte do mundo também sente.
Não haveria modo mais massivo de gerar uma propaganda tão intensa e
patrocinada pelo próprio inimigo que algo assim.
Se contabilizarmos os custos que o Hamas teve com o
ataque e os custos que Israel está tendo com a reação, versus a repercussão mundial
a serviço do antissemitismo, diríamos que a ideia é horrorosamente eficaz a
favor dos agressores, no caso o Hamas, que apesar de serem os agressores iniciantes do ataque ainda podem
acabar como vítimas, levando junto o equilíbrio de nações que apoiam a
iniciativa judia, desestabilizando o moral americano e do bloco ocidental que o
apoia.
Biden está correto em defender a autodefesa já que é um
princípio básico?
Porém, se alguém mata a sua família, você poderia dizimar a vizinhança à caça
do assassino?
A caçada de Bin Laden foi uma empreitada inteligente dos EUA, construída por uma estratégia mais discreta sob a tenacidade, a tecnologia e a capacidade política, algo que Netanyahu não parece cogitar.
Os palestinos acabaram como uma amalgama indistinta entre o
apoio ao Hamas e o cotidiano imposto pelas circunstâncias socioeconômicas de tão
entremeadas que são, assim como também todos os demais povos acabam por
subjugar-se em circunstâncias onde os cidadãos não têm como se opor ao
poderio econômico que se estabelece através das armas, a exemplo do que
acontece na Rússia, China, Myanmar, Coreia do Norte, Venezuela e por aí vai uma
enorme lista, atualmente crescente, infelizmente.
Radicalismo e ditadura estão na moda, em alta.
Mesmo que o Hamas perca essa guerra, ainda assim o Hamas conseguiu o que
almejava tal como uma medusa, que após a sua morte, seus pedaços irão se
regenerando à sombra do esquecimento.
Aos palestinos sobra apenas o sofrimento e a conta da
despesa, assim como sobra para qualquer povo liderado por um radical.
No final, uma certeza ao menos: todos os lados perdem.
Essa guerra não é futebol, porque não importa qual seja o
placar do jogo, não terá vencedor.
Na maioria das vezes, o certo é relevar os erros recíprocos
reescrevendo o passado através de um futuro novo, onde a esperança possa
florescer apesar de alguns sacrifícios multilaterais.
Não há outra solução.
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