PREÂMBULO
“Hot Crowns” é uma distopia
política contando a história de uma nação imaginária na luta para encontrar
seu melhor caminho nos descaminhos da paixão.
Qualquer semelhança com a história de qualquer nação é mera coincidência.
O imaginário é uma colcha de retalhos onde costuramos nossas
percepções e sob ela nos abrigamos.
Este post faz parte de uma série: capítulo anterior
Hot Crowns – Cap. II – O Revés
Opus I, que dera inicio à dinastia da oposição pelo povo contra o status quo, diante
da necessidade de um retiro espiritual para decidir os novos caminhos de expansão de seu reino, havia endossado o empossamento de Opus II, um dos mais fiéis de sua dinastia, na
premissa que poderia governar através de sua influência, quando
necessário, até seu regresso.
O poder, no entanto, tem a força que nos toma por refém dos nossos desejos mais
íntimos de grandeza, tornando-nos cegos, surdos e com profunda amnésia de
nossas origens, resultando na indiferença
àqueles que nos sustentam no poder, imaginando que esse momento de delírio
megalomaníaco é por si só suficiente para que nos suportem as intemperanças da
arrogância e da intolerância durante o apogeu desse poder.
Opus II buscava impor sua autoridade aos murros sobre sua mesa imperial, porém
ficava cada vez mais isolado do conselho. A sua intemperança denotava mais sinal
de fraqueza do que demonstração de força. Era na verdade, uma lacuna de
poder que buscava impressionar através de explosões de temperamento
descontrolado.
Os verdadeiros líderes seduzem, envolvem e conduzem sem que os liderados se imaginem seduzidos, envolvidos ou conduzidos.
Esse não era o perfil de Opus II, cuja fala dura repelia quando deveria atrair.
Faltava-lhe o dom de cativar.
Assim começou a queda de Opus II ao longo dos anos através do poder
subjacente do conselho que esperava o momento certo para agir. Havia no
conselho uma oposição que aguardava uma oportunidade no silêncio enquanto
cavava os túneis sob os alicerces políticos do rei substituto no desejo de
minar toda a dinastia de Opus I, para sempre!
No momento certo,
mediante as fraquezas de Opus II e pelo desgaste político constante que
as suas posturas somadas às decisões impopulares vinham corroendo seu equilíbrio
político, o conselho percebeu a oportunidade para depor o sucessor temporário de Opus I de
tal forma que transformasse essa ação como legítimo instrumento de salvaguarda do reino e trouxesse para essa iniciativa os louvores dos heróis que resgatam o povo de um futuro sombrio nas mãos de uma dinastia ímpia.
A estratégia deu resultado aos olhos populares mediante um show organizado pelo conselho diante da massa em evento público que por meio da votação demonstrava que a maioria dos votos contrários à continuidade de Opus II consumava a legitimidade da manobra de interesses.
O circo político estava instalado levando as massas ao delírio, atraindo a atenção de todo o reino.
Um show que continuaria a adubar os ânimos do povo, outrora mais distante dos reveses políticos, mas
que agora crescia em sua participação, porém cada vez mais dividido. Parte da população tornara-se seguidora da dinastia Opus e o restante dividia-se em grupos rivais, o que dificultava estratégias unidas de manobra política na luta pelo poder.
O fruto inusitado da novidade daquelas ações gerava um estado de surpresa e confusão.
Os meandros jurídicos, conforme as leis do reino, serviam de amortecedor
emocional, mas não evitavam a emoção crescente represando-se na alma da massa dividida e confusa.
Rei deposto é rei substituído.
Ao conselho não restava outra opção que não fosse escolher o próximo da linhagem real — o príncipe Lupus — que apesar de não contar com o carisma de que necessitava, ainda assim tentou autenticar-se no governo do reino, contudo enfrentado objeções de parte da corte e do conselho, já que ali estava não por escolha mas pela demanda sucessória naqueles casos. Ainda assim, os rivais felicitavam-se por acreditar que o mal maior havia sido superado sinalizando um passo à frente em direção às suas metas na disputa de poder.
Durante o curto reinado de Lupus, não lhe foi possível conquistar a alma do povo nem tão pouco segurar as rédeas da corte, apesar de seu porte educado não ser capaz de fomentar a liga que estabelece a hegemonia de comando.
Um poder estável é mantido pelo poder econômico e pelo carisma.
Faltava a Lupus ambos.
Ainda, tornando tudo pior, os bons ventos que sustentaram o início do reinado de Opus I haviam sido substituídos gradualmente por mudanças desfavoráveis do panorama geral em todos os reinos. Uma mudança de sorte que passa desapercebida aos olhos dos súditos, cuja massa é pragmática tomada pela necessidade de suprir o cotidiano sem muita memória do ontem, porque "investimento" é algo para nobres que podem aguardar o tempo para o seu retorno financeiro, onde instrução faz parte desse privilégio, seja pela educação ou pela vocação, algo que não é acessível à grande maioria.
E assim Lupus teve a sua chance e sem a ajuda da sorte e sem um carisma competitivo ficou à deriva das forças evocadas pelas boas lembranças e do carisma da dinastia Opus gravadas na alma do povo durante o seu reinado, ora pelo fanatismo, ora cultivadas pelos pequenos favores à população carente. Eram sementes que continuaram a germinar mesmo depois que o lavrador abandonara a terra.
Era necessário conter a massa que começava a dar sinais de
uma inquietude que preocupava a corte e o conselho, trazendo constrangimento à estabilidade do
reino.
Era preciso encontrar um rei que pudesse rivalizar em carisma com Opus I, já que Lupus fracassara, apesar dos esforços deste em permanecer mais tempo.
O conselho do reino aprendera a lição que
não se erradica uma liderança sem que se possa substituir por outra de igual força, pois o déficit de poder agregador é
tão ameaçador quanto o seu excesso.
Mas quem? E como?
Apesar dos esforços, não se encontrava talento à altura e não havia tempo para formá-lo.
Talvez fosse a hora de mudar de estratégia, buscando outros meios, porém quais?
Esse era o desafio que buscava abrir a porta para a renovação do poder através da subjugação da dinatia Opus.
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