novembro 26, 2022

Hot Crowns - Capítulo III - A Estratégia

 


PREÂMBULO

 “Hot Crowns” é uma distopia política contando a história de uma nação imaginária na luta para encontrar seu melhor caminho nos descaminhos da paixão.
Qualquer semelhança com a história de qualquer nação é mera coincidência.

O imaginário é uma colcha de retalhos onde costuramos nossas percepções e sob ela nos abrigamos.

Este post faz parte de uma série: Capítulo anterior


Hot Crowns – Cap. III – A Estratégia


A oposição lutava com o “carisma consolidado” que leva os mais exaltados ao fanatismo!

Fanatismo ameaça a estabilidade do poder de um reino pois o radicalismo é cego pela paixão que lança mão do imediatismo a qualquer custo como promotor de soluções.

Uma vez que um líder preenche o vácuo de liderança faz-se muito difícil superá-lo.

Não basta uma nova liderança ser tão cativante quanto a primeira.
Ela precisa ser mais sedutora.


Diante do impasse pela falta de vocações, restava aos opositores da dinastia Opus uma estratégia nova que pudesse abrir um caminho à solução que se buscava: finalizar a hegemonia daquela dinastia pois a oposição temia que ela pudesse se radicalizar caso os destinos do reino prosseguisse sem qualquer ação mediadora.


Em um dos condados do reino surge um grupo com essa nova estratégia.

Se não era possível competir com o carisma e a articulação política da dinastia Opus, então restava apenas mergulhar nos meandros de seu poder para encontrar as ilicitudes, e a partir delas desgastar a sua imagem diante de evidências e provas, conduzindo os culpados às penalidades cabíveis, até mesmo à supressão da liberdade.

A teoria era brilhante, mas na prática ardilosa já que exigia um grande esforço de diligência investigativa, muita sorte que dependia de informações de terceiros no afã de levantar os “descaminhos” do poder na busca de recursos monetários por meios alternativos, uma vez que o rastro das atividades  sensíveis precisam desaparecer como condição básica de execução, ainda mais tratando-se de pessoas de altíssima influência e poder econômico, portanto possuidoras de todos os meios à disposição de seus interesses para atingir seus objetivos.


Afinal de contas, um rei sustenta-se por sua capacidade de diretriz econômica e política, sendo esta última a habilidade de negociar interesses concomitantemente à simpatia pública.


Este condado concentrou-se na busca das eventuais falhas de sigilo na distribuição de recursos econômicos, já que sem estes não há reinado que se sustente.

Reis precisam de recursos, riquezas e moeda de troca de favores, sem o que não podem exercer seus poderes à plenitude, e no afã desta conquista, acabam cedendo às oportunidades sedutoras dos caminhos tortuosos, já que mais fartos e ágeis, que vão traçando ao longo de seus reinados os cursos de rios tortuosos conduzidos por um mal comum: a ambição humana como meio de alavancar ação.

O sorriso é a porta de entrada, mas a capacidade econômica é o meio para a porta de saída.


Esse condado concentrou-se em rastrear todas as operações econômica de Opus I, registrando seus envolvimentos com grandes personalidades do reino.
O trabalho não poderia deixar de florescer!

Todo rei que se preze precisa negociar poder através de favores que se convertem em moeda de troca. 

O desafio consiste em fazê-lo sem que a corrupção torne-se um estilo que acabe por prender a sua vítima nos laços da dependência.

Grandes nobres estavam na lista desses favores do rei em operações oficialmente não regulares, mas frequentes em qualquer reinado, embora essa frequência não justifique a ilicitude, termina por se converter em modus operandi comum a qualquer sistema político, pois nasce de uma característica humana que define seu atraso social, principalmente quando os objetivos finais são escusos, inconfessáveis.


A "Lei" sempre está aquém das necessidades dos maiores interesses e os lobbies buscam atualizá-la, mas enquanto isso, como o grande capital não tem o hábito da espera, precisa antecipar-se a ela.

Com o tempo, mediante as ações de grupos que negociam interesses, as leis são paulatinamente flexibilizadas para atender os lobbies mais poderosos.


Este grupo do condado, à medida que avançava nos trabalhos, começou a produzir evidências jurídicas, quando então entendeu que diante das provas era o momento de iniciar processos administrativos reais.
Por isso procurou um juiz que tivesse a coragem de fazê-lo, já que do sucesso ou insucesso da empreitada certamente acarretaria reveses pesados de toda ordem para todos aqueles que ousaram contestar as irregularidades de tão forte dinastia.


O condado deu por início os processos que envolviam não só o rei como altos nobres, começando por estes, abrindo o seu caminho através dos enfrentamentos menores para subsidiar o maior.

Afinal, um rei não subsiste sem carisma e sem poder econômico!
Uma vez que é certo que qualquer reinado tem seus segredos à disposição de quem possa escrutiná-los e prová-los, o grupo trabalhou intensamente como só mesmo devotos o fazem.

Até hoje, ninguém sabe contar os motivos que levaram aquele juiz de condado e seu grupo a desafiar poderes de uma dinastia real tão poderosa, muito superior a deles.
Uns acreditam que o fora por idealismo e patriotismo, outros alegam interesses pessoais na busca de ascensão rápida. Outros, ainda, entendem que por ambos, quando se justifica a segunda através da primeira à própria consciência.

O fato concreto é que eles apostavam suas carreiras, as suas vidas.
Uma aposta alta que logo conquistou o interesse de todos!

Seja como for, as ordens de prisão começaram a ser expedidas pelo juiz com base no que fora recebendo, e a cada réu cúmplice do rei Opus I que fora preso havia de ser subjugado a interrogatórios que pudessem destrinchar as intrincadas cadeias de recursos que subsidiavam as operações econômicas de Opus I que teciam a capa da transparência, algo tão cobiçado.

Opus I, além de político era também hábil em apagar suas pegadas de poder, no entanto, inexiste ser humano perfeito, e algumas ossadas ficaram mal enterradas ao longo de sua caminhada apesar de todos os esforços em contrário.


À medida que as investigações prosseguiram, a divulgação dos eventos foram se popularizando e adquiriu grande interesse público onde as grandes personalidades do reino pareciam ter perdido o direito à exceção do erro, fazendo parecer que a lei de fato valia para todos, da mesma forma.
Teriam mesmo arrancado a venda de Têmis, a deusa da justiça?!
Venda essa, aliás tão subjetiva, pois a mesma venda que ignora o privilégio, também ignora.
Seja como for, esse símbolo de fato reflete o nosso senso de justiça à sua natureza humana, jamais divina.

O povo via isso com os olhares do alento e da esperança que só a miopia da natureza humana proporciona.

O processo de julgamento finaliza condenando os réus que, insatisfeitos, recorreram à sua revisão, que no entanto confirmou a sentença condenatória.
O juiz determina a prisão de Opus I em ato único na história às vésperas em que se preparava para voltar ao poder.

Era um momento dramático, que tirava um rei em plena atuação no palco político na frente da plateia de todo o reino!

A prisão do rei, ainda mais nestas circunstâncias, tornou-se um show que rivalizou com os maiores eventos desportivos já havidos no reino, ecoando por todos os outros, onde a justiça parecia florescer  naquele reino renovada e com a força de credibilidade genuína que deveria ter, projetando a imagem daquele grupo e do juiz ao pedestal de heróis para uns e super vilões para outros.

A grande muralha acabava de ser erguida, separando o mesmo povo, definitivamente.

Opus I usou de todos os recursos, alcançando os juízes mais altos do reino em novo julgamento, que no entanto confirmaram por maioria de votos os resultados anteriores.

Aquela minoria que se posicionara contra não esgotaria suas ações na frustração daquele momento. Até o senso de direito ganhou seu muro da vergonha separando duas verdades, já que este senso se baseia na verdade, e ao que parece a verdade seria uma só, mas dessa forma fazia nascer duas verdades que solapavam o sentimento de confiabilidade no próprio exercício da justiça que decidia sem a competência da segurança em fazê-lo.

Ao todo, três cortes confirmaram as mesmas decisões.

Opus I parecia estar fadado a permanecer um longo tempo no cárcere, maior que o seu prognóstico de vida face à sua idade avançada.

O reino em polvorosa ficou sem Opus I e seu substituto não tinha o perfil que era preciso para competir com Rufinus, o líder que havia conseguido aglutinar a oposição da dinastia Opus, outrora dispersada, e com quem competia à ocasião em que houvera sido encarcerado.

Rufinus representava a oportunidade que a longo tempo era esperada como solução de substituição a Opus I que pudesse alavancar a massa em número compatível aos seguidores da dinastia Opus.
Talvez fosse essa a esperança daquele grupo e seu ousado juiz, dar ao povo uma oportunidade nova, contudo, o entrave maior consolidou-se pela ausência de um líder que pudesse realmente conduzir de forma segura esse processo de transição, já que não basta subtrair algo deixando vago o que não se pode substituir. 

O vácuo de liderança traga o equilíbrio, e o equilíbrio se conquista pela sedução da maioria.

A estratégia daquele condado havia sido concluída com êxito, buscando conciliar a lei com a política na prevenção de solução da continuidade indômita de Opus I e sua dinastia, mas o tempo traria surpresas inesperadas para todos, onde tais falhas de estratégias e de talentos mudariam permanentemente o espírito e a cultura desse reino.


Continua no próximo capítulo...





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